segunda-feira, 7 de outubro de 2013

“O Vale do Terror”, de Arthur Conan Doyle


- É uma mensagem cifrada que o Doutor Watson e eu tivemos ensejo de resolver. Mas porquê… o que há com esses nomes?
O inspector olhou alternadamente para nós dois com ar atónito.
- Apenas isto – disse ele. – O senhor Douglas, da Mansão Birlstone, foi assassinado hoje de manhã, em circunstâncias espantosas.

Sherlock Holmes. Poucas personagens da história da ficção dispensam tão facilmente qualquer tipo de apresentação. O detective do número 221B de Baker Street é imediatamente visualizado mesmo por quem nunca tenha lido uma única página das suas aventuras.
Familiarizei-me com o Sr. Holmes ainda bastante novo, graças a uma daquelas “colecções juvenis”. Depois disso, inevitavelmente, a televisão e o cinema ajudaram a que o senhor do cachimbo nunca saísse inteiramente de moda. Ora, como referi recentemente noutro post, Holmes está novamente em alta, e à conta disso a nostalgia tratou de me seduzir para o regresso à obra escrita de Sir Arthur Conan Doyle.
A Bertrand teve a feliz e muy nobre ideia, nos anos recentes, de apostar na colecção 11x17 de livros de bolso, lançando dezenas de títulos de elevada qualidade, ideais para quem quer levar um livrinho leve pra ler no avião, na praia, ou durante o debate do Orçamento do Estado.
E assim, por menos de 7 Euros, marquei encontro com o senhor Holmes.
O Vale do Terror é um livro bastante interessante, e até curioso, pois trata-se de uma história de Sherlock Holmes… praticamente sem Sherlock Holmes! Como é habitual na maioria das suas histórias, a narração é feito pelo seu estimado colega, o Doutor Watson, sendo que Holmes aparece apenas duas ou três vezes “em cena”, mas – obviamente – precisamente para desvendar o mistério, recorrendo ao seu método único.
O interesse deste livro vai muito para além do crime que o detective e os seus companheiros solucionam, pois na verdade O Vale do Terror são duas histórias numa. Elementar, meus caros leitores de blogue! A história começa em redor de um crime violento, que rapidamente é resolvido por Sherlock em muito poucas páginas, embora de forma deveras entusiasmante, recuando a história várias décadas logo de seguida, para contar o que se passou previamente e que nos levou até ao crime no presente.  É uma fórmula extraordinariamente bem concebida, e se nos lembrarmos que o livro foi publicado em 1915 (quase há cem anos!) presumo que tenha sido até certo ponto inovador para a altura.
A transição entre as duas histórias é, ela própria, feita de uma forma excepcional, com um diálogo directo entre o Dr. Watson e o caro leitor. Subitamente, somos transportados para um ambiente de “Velho Oeste” americano, com xerifes, comboios e muitas pistolas. E é aqui que a história verdadeiramente cresce. Se a primeira parte é “apenas” a investigação de um misterioso crime numa mansão britânica, a segunda parte é uma cascata vigorosa de acção que decorre no ambiente das sociedades secretas, cheias de membros obscuros, simbologia misteriosa e todos os ingredientes que de um momento para o outro nos dizem “prepara-te para o embate”. Não conheço o suficiente sobre a maçonaria, mas toda a descrição que o autor faz dos “Homens Livres” que pertencem à “Loja” não esconde minimamente a ligação que pretende fazer com este mundo à parte. E a exploração do tema é feita de forma muito inesperada, mostrando uma veia extremamente violenta e que recorrentemente usa a desculpa de “estamos apenas a defender-nos” para justificar todo o tipo de atrocidades.
É um livro extremamente fácil, e agradável, de ler, cheio de personagens interessantes e muito bem caracterizadas. Enquanto lemos a primeira parte somos confrontados com vários episódios em que ficamos com aquele ar “hum, há aqui qualquer coisa que não bate certo”, e depois vamos desmontando o puzzle à medida que mergulhamos na segunda parte, e agarramos nas migalhas que o escritor nos deixou no início.
E nos bastidores há um outro elemento fortíssimo que marca a narrativa. Alguém que nunca surge na história, mas cuja presença paira como uma sombra à qual não se consegue escapar: o Professor Moriarty. O eterno nemesis de Sherlock. O génio do crime que tudo manipula à distância. Que forma fenomenal de conceber o “mito” da personagem, dando-lhe um fôlego invejável sem nunca aparecer ou intervir na acção. Delicioso!
Entretanto, descobri alguns pormenores engraçados em redor deste título, nomeadamente o facto de já ter sido alvo de várias adaptações à televisão, mas também ao cinema. Inclusive num filme mudo logo em 1916. O que não deixa de ser peculiar. É sequer possível conceber um “filme mudo” em redor de Sherlock Holmes? A personagem que mais vive à conta das palavras? Da sua investigação e do seu método de observação/dedução lógica? Dificilmente conseguiremos saber, dado que o filme está considerado “perdido” (link). Pode ser que tenhamos a sorte de aparecer uma cópia esquecida nalgum arquivo poeirento, como aconteceu recentemente com o primeiro filme de Orson Wells. Em alternativa, resta-nos esperar pela adaptação da nova série da BBC.

Uma coisa é certa: a história é muito interessante, e cheia de reviravoltas inteligentes que nos mantêm de olhos esbugalhados até à última página. E só mesmo para estragar a surpresa, posso dizer que desta vez não foi o mordomo! :)

2 comentários:

  1. muito bom sim sr adorei ler esta tua... "análise" ao conteúdo do livro sem fazer muitos spoilers.. aliás abrindo mesmo é a curiosidade sobre este livro.. mas o que eu realmente queria fazer aqui era pedir-te desculpa pois no início do penúltimo parágrafo eu percebi "Entretanto, descobri alguns pokemons..."... ... ... o que não deixaria de ser absolutamente fantástico, aliás chego mesmo a ter pena de não ser isso mesmo que lá está escrito. XD
    Com isto, deixo aqui as minhas desculpas e um grande abraço.
    ;D

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  2. :D
    Bom... confesso que associar "Vale do Terror" e "Pokemons" não me parece absurdo de todo. Hehehehe.
    Elementar, meu caro Pikachu...

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